segunda-feira, 21 de outubro de 2013

O que é isso companheiro - Já vi a história - Agosto de 1954: a grande tragédia - O "Petróleo é nosso"

Agosto de 1954: a grande tragédia O "Petróleo é nosso" A campanha pela autonomia brasileira no campo do petróleo foi uma das mais polêmicas da história do Brasil republicano, de 1947 a 1953 o país dividiu-se entre aqueles que achavam que o petróleo deveria ser explorado exclusivamente por uma empresa estatal brasileira e aqueles que defendiam que a prospecção, refino e distribuição deveriam ser atividades exploradas por empresas privadas, estrangeiras ou brasileiras. Os nacionalistas argumentavam que se o Brasil não criasse uma empresa estatal, fatalmente aquele produto estratégico para o desenvolvimento econômico, seria oligopolizado pelas grandes corporações internacionais, pela Standard Oil, Shell, Texaco, Mobil Oil, Esso, etc... e que desta forma o país se veria refém daquelas grandes companhias. Em dezembro de 1951, Getúlio Vargas enviou ao Congresso o projeto 1516 que previa a criação de uma empresa mista, com controle majoritário da União. Este projeto sofreu um substituto que afirmava um rígido monopólio estatal, excluindo qualquer participação privada nele. Pelo país afora os debates se ascenderam. O Partido Comunista Brasileiro, na ilegalidade, liderou uma série de manifestações, juntamente com os estudantes da UNE, a favor do monopólio estatal, enquanto a grande imprensa ("O Estado de São Paulo", Diário de Notícias, "O Globo", etc...) defendia a posição dos interesses privatistas. Grande parte da oficialidade mostrou-se simpática a estatização do petróleo, apesar de não concordar com o ativismo dos comunistas e sua adesão as teses nacionalistas. Finalmente, depois de uma batalha parlamentar de 23 meses, o Senado terminou por aprovar a criação da Petrobrás, sancionada por Vargas - lei 2.004 - em 03 de outubro de 1953. O Acordo Militar Brasil - Estados Unidos A ambigüidade de Vargas manifestou-se igualmente na assinatura, em março de 1952, de um acordo militar com os Estados Unidos, no qual o Brasil receberia equipamentos militares e serviços comprometendo-se a fornecer materiais básicos e estratégicos (urânios e areias monazíticas) aos americanos. De certa forma este acordo foi firmado para atenuar as críticas que Vargas havia feito uns tempos antes, em dezembro de 1951, denunciando violentamente a política da remessa de lucros das grandes corporações estrangeiras que teriam remetido para o exterior, na época do Governo Dutra (1946-51), 950 milhões de cruzeiros além do que era permitido em lei. Novamente a política de Vargas isolou-o ainda mais. Para os nacionalistas ele não deveria ter aproximado militarmente dos EUA, para os defensores do capital privado ele não deveria ter criticado a política de remessas de lucros. Antecedentes | A previsão de Vargas | Esperanças e temores | A bifurcação da política econômica | O petróleo é nosso | Acordo militar Brasil/EUA | A política externa dos EUA | Carlos Lacerda e o caso da "Última Hora" | O cerco se fecha: o Clube Militar | O atentado da rua Toneleros | O suicídio e a Carta Testamento | Bibliografia Agosto de 1954: a grande tragédia A política externa dos Estados Unidos Quando Vargas assumiu a presidência, em 1951, os Estados Unidos eram ainda governados pelo presidente H. Trumann, um democrata. Mas em 1953 assumiu o governo americano o general republicano D. Eisenhower, com uma política externa marcadamente anti-comunista. Seu secretário de Estado Jonh Foster Dulles deu início a uma forte arregimentação de forças para lutar por todos os meios contra a influência comunista. Para os americanos republicanos o nacionalismo descolonizante, em expansão pelo Terceiro Mundo, era um aliado tático do comunismo soviético. Desta forma a política de Vargas começou a ser mal vista pelos norte-americanos que restringiram o financiamento prometido, quando não interrompendo-o inteiramente. Como sinal desta indisposição deles para com o nacionalismo, em julho de 1954, participam, por meio da sua central de inteligência, a CIA, da derrubada violenta do governo nacionalista e reformista de Jacobo Árbenz na Guatemala, acusando-o de acumpliciar-se com os comunistas. Foi por sua vez o sinal para que os grupos direitistas brasileiros acirrassem ainda mais sua companha. Carlos Lacerda e o Caso da "Última Hora" O principal inimigo de Vargas era o jornalista Carlos Lacerda, um ex-comunista que havia passado para a extrema-direita nos anos 40 e editava o jornal "Tribuna da Imprensa". Para Lacerda, Vargas não só era excessivamente tolerante para com os comunistas como seu governo era minado pela corrupção endêmica e pelo descarado favorecimento dos seus aliados. Entre estes encontrava-se o jornalista Samuel Wainer proprietário da "Última Hora", um jornal fundado para dar cobertura ao governo de Vargas. O sucesso jornalístico de Wainer atraiu contra si toda a grande imprensa proporcionando a Lacerda uma motivação política para atacar violentamente Vargas. Wainer terminou submetido a uma CPI do Congresso, em abril de 1953, e condenado a 15 dias de cadeia por negar-se a informar quem eram os seus financiadores. Lacerda por sua vez, graças ao seu anti-comunismo cada vez mais inspirado em MacCarthy, o senador direitista americano, encontrava crescente apoio entre os militares, particularmente entre os oficiais da FAB (Força Aérea Brasileira) tradicionalmente anti-getulistas e simpáticos a soluções golpistas, porque seu líder, o Brigadeiro Eduardo Gomes, havia por duas vezes sido derrotado em eleições presidenciais. Por outro lado a classe média sensibilizava-se pelas constantes denúncias de corrupção, urdidas naquela verdadeira fábrica de difamação que era a redação do jornal "Tribuna da Imprensa", dirigidas contra o governo de Vargas. O Cerco se fecha: o Clube Militar Enquanto os Estados Unidos suspendiam os financiamentos programados pelo BIRD e pelo Eximbank. devido a política petrolífera brasileira, as eleições do Clube Militar foram decisivas para o futuro de Vargas. Das chapas concorrentes, em maio de 1952, a nacionalista, representada pelo Gal. Estilac Leal e a chamada Cruzada Democrática, dos anti-comunistas, liderada por Alcides Etchegoyen, foi a última, a dos anti-comunistas, quem recebeu consagradora maioria (8.288 votos contra 4.489 dados a Estilac). Lacerda e os golpista exultaram. A derrota dos getulistas fez com que Vargas tentasse ainda uma conciliação, fornecendo a UDN, o partido da oposição, dois ministérios, além de entregar a Petrobrás a um undenista (o Gen. Jutacy Magalhães). Mas foi repudiado. O cerco se fechava. Ao bloqueio americano, somava-se à derrota no Clube Militar, o processo contra Wainer e o radicalismo crescente da oposição udenista. Para acirrar mais ainda os ânimos, 82 coronéis assinaram um manifesto, em 8 de fevereiro de 1954, entre outras coisas contra o aumento do salário mínimo determinado por Vargas. O atentado da Rua Toneleros Indignado com a violência dos ataques pela imprensa, rádio e televisão (na TV-Tupi do Rio de Janeiro) movidos por Carlos Lacerda contra seu patrão Getúlio Vargas, o chefe da guarda palaciana Gregório Fortunato, contratou dois pistoleiros para executarem Carlos Lacerda. Na noite de 5 de agosto de 1954 quando o jornalista se aproximava do seu apartamento, na Rua Toneleros, foi vítima de um atentado. As balas que mal o feriram no pé foram no entanto mortais para o major Rubens Vaz da FAB que lhe fazia informalmente o papel de segurança. Imediatamente todas as evidências voltaram-se para o Palácio do Catete, sede do governo no Distrito Federal. Oficiais da FAB resolveram fazer um inquérito por conta própria visto que alegavam não poder confiar na polícia de Vargas. Formou-se a chamada "República do Galeão", um inquérito dirigido por integrantes da FAB a revelia das autoridades constituídas. Em pouco tempo os criminosos foram detidos e Gregório Fortunato preso. O poder de Vargas esvaziou-se por completo. Antes de suicidar-se já estava politicamente morto. O suicídio e a Carta Testamento Na tragédia "Júlio Cesar" de W. Shakespeare, num primeiro momento, a morte do ditador César é recebida com aplausos mas graças ao discurso de Marco Antônio, seu amigo e seguidor, a multidão muda de lado. Em pouco tempo os assassinos de César são perseguidos, mortos ou obrigados a fugir. O mesmo ocorreu após a morte de Getúlio Vargas. Depois de uma reunião ministerial em que verificou-se a inutilidade de qualquer resistência (um manifesto de Brigadeiros foi seguido de um de Generais que pediam sua renúncia), Vargas recolheu-se aos seus aposentos e, na manhã do dia 24 de agosto de 1954, suicidou-se com um tiro no peito. Seu Marco Antônio foi a Carta Testamento imediatamente lida em todas as rádios onde Vargas explicava de uma maneira extremamente comovente as razões do seu gesto. A opinião pública enfurecida voltou-se contra seus inimigos. Jornais foram invadidos e rádios incendiadas ou depredadas, a Embaixada americana atacada e Carlos Lacerda obrigado a refugiar-se no exterior. O golpe que estava em andamento para depor Vargas foi sustado. Um verdadeiro levante de massas impediu que a normalidade constitucional fosse rompida naquele momento. Mas as forças que levaram Vargas ao suicídio em 1954 não desistiram. Rejeitadas alguns anos depois tornam-se valiosas em 1964. O gesto do presidente protelou o golpe militar em dez anos. A Carta Testamento "Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam e não me dão direito de defesa. (...) Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais posso vos dar a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. (...) Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História." Bibliografia BELOCH, Israel. ABREU, Alzira A. Dicionário Histórico-biográfico brasileiro, 4 vols., Forense, Rio de Janeiro, 1984. BENEVIDES. Maria Victória. A UDN e o Udenismo (1945-1965), Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1981. CARONE, Edgar. A República Liberal. II Evolução Política (194-1964), Difel, São Paulo, 198. CONY, Carlos Heitor. Quem Matou Vargas: 1954 uma tragédia brasileira, Editora Bloch, Rio de Janeiro, 1974. D'ARAÚJO, Maria Celina S. O Segundo Governo Vargas (1951-1954). Zahar Editora, Rio de Janeiro, 1982. DULLES, Jonh W.F. Getúlio Vargas: biografia política. Editora Renes, Rio de Janeiro, 1967. DULLES, Jonh W.F. Carlos Lacerda: a vida de um lutador (1914-1960), Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1992. SILVA, Hélio. 1954: Um Tiro no Coração, Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1978. SKIDMORE. Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo. Editora Saga, Rio de Janeiro, 1969.

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